Monday, December 25, 2006

Stapunt...

Um gosto chato de ciúme na boca,
Uma certa tensão no ser,
Uma leve sensação de frio e mal estar na barriga.

Não há caminho que leve a uma verdade absoluta dos fatos,
Todos nos levam a suposições que nos torturam em imagens,
pela nossa incapacidade de alcançar a onisciência.

Toda verdade é um ato de fé,
O que sobra são discursos, mais ou menos “verificáveis”.

Um gosto chato de ciúme na boca,

Nos é impossível refazer o caminho da verdade e do passado,
mas de nossos atos não podemos no livrar,
independente da ilusão de caminhos que percorramos em busca de uma verdade que nos acalme,
que nos devolva o gosto doce do existir e do compartilhar.

Gosto amargo, quero-te longe de minha boca,
longe de meu ser,
Mas como expurgá-lo me é desconhecido.

Levemente desço a escada ao inferno,
E retorno,
escolho a entrega e o compartilhar, até onde for possível.

E posto ser amargo,
Me entregarei e me deliciarei em ti enquanto formos obrigados a estar juntos,
Enquanto isso me for possível.

Nilo Santana, 25 de dezembro de 2006 14:45;57

p.s. o mundo é realmente mto engraçado, e nós seres humanos somos tão toscos e tão maravilhosos ao mesmo tempo. nem me importa tanto o sentido da vida ou coisa assim mas nossa impermanência continua a me afligir, de tempos em tempos, de crises em crise... nunca o suficiente para que resolva decididamente me encontrar.

Tuesday, December 05, 2006

Bernie
O que falar de Bernie? Primeiro que eu cheguei atrasado e perdi as cenas iniciais. Uma lástima isso ocorrer, mas foi a primeira vez que eu ia àquela sala de cinema e tive problemas para decidir-me onde estacionar. Perdoável.
Bernie foi o filme que salvou a semana que começou com café da manhã em plutão. Fugindo do clichê, a trilogia dessa semana seguiu uma trajetória ascendente de qualidade e não o contrário. Bernie é um rapaz que morou no orfanato até cerca de 30 anos e vivia economizando dinheiro para encontrar os pais. O filme "começa" com Bernie saindo do orfanato e descobrindo a vida, já de cara quase sendo atropelado por um ônibus (ta bom talvez isso tenha sido algo próximo daqueles personagens estereótipos com caracterização bem exagerada de parte do cinema americano, mas em Bernie isso soa como prenúncio do que virá e acho sinceramente que os personagens são muito mais respeitados que nos filmes americanos. Ademais, trata-se de uma comedia e o exagero, ou melhor o tragi-cômico é uma das formas de se explorar a comédia). Vai sendo "enrolado" por uns (a agente de imóveis), equivocadamente entendido por quase todos (como pelo vendedor da câmara de vídeo) e cada vez mais distanciado do exterior, ou melhor, dirigindo cada vez mais a forma de ver o mundo a partir de um ponto de vista próprio, sem muita abertura para um eventual feed back (ou "senso crítico" talvez ?) que lhe confirme ou não aquilo que crê. Válido aqui citar o filme sexto sentido, na fala do menino que diz que os espíritos vêem aquilo que querem ver. Pois é, não só os espíritos. Aparentemente a solidão de Bernie o leva a fechar-se cada vez mais em suas hipóteses e especulações. Encontra o pai que parece querer aproveitar-se da situação para rever, e talvez vingar-se (isso não ficou muito claro para mim, tal sentimento de vingança) da mãe de Bernie e por isso não desmente a teoria de Bernie. A Personagem da "namorada" de Bernie, nos brinda com cenas com forte teor irônico, seja com humor negro (como a do atropelo do pai da "namorada") ou a cena em que ela comenta a descrição que Bernie oferece dos "policiais" que rondam o gerador elétrico no qual eles se abrigavam.
Dito isso, importante alertar que o filme contem cenas fortes de violência "gratuita". Uma das coisas mais sensacionais do filme é conseguir imprimir uma áurea doce, suave, inocente, nas cenas de violência, sem que elas percam porém todo o seu horror. Grotescas e doces ao mesmo tempo isso foi a primeira coisa do filme que ficou marcado em mim, assim que saí da sala. Talvez os moralistas não consigam ver nada de doce nem de inocente nos atos de "violência gratuita" que o filme apresenta. De fato poucas foram as pessoas que em "Hable com Ellla" viram no "estupro" um símbolo de romantismo e de entrega, a partir do qual a vida dele se desgraça e ela consegue sair do coma. A maioria das pessoas com quem conversei se referia à cena com um certo horror. Em tempos de debates de alteridade talvez valesse a pena tentarmos nos colocar mais no lugar dos personagens "abjetos e marginalizados" despidos porém de nossa já criada couraça moral (influência reichiana na expressão? hehe...), sem que isso signifique a aceitação moral do praticado, ao final. Ou seja, não quero discutir se a ação de Bernie ou do personagem de Hable com Ella deve ou não ser moralmente reprimível pela sociedade. Só peço que tentemos olhar sua condutas não com o nosso olhar de incluídos na moral social, mas sim despidos de qualquer busca de julgamentos. Feito essa aproximação, aí sim, voltemos, e já percebida a identidade e semelhança que nos une a todos, façamos nosso julgamento daqueles que são, antes de tudo nossos irmãos (quero dizer seres humanos como nós). O relativismo e o discurso de respeito à alteridade não pregam necessariamente uma passividade, nem afronta a necessidade de regras de regulação social, apenas nos ajuda a perceber que tais regras são construídas historicamente e não contém uma qualidade de "verdade unívoca" (essa expressão verdade unívoca é realmente cômica..).
Enfim, pena que só passará em duas sessões aqui em Salvador e ainda bem que pude estar em uma delas, qual seja, a primeira, em 26/10/06 na Sala de Arte da Aliança Francesa.
Nilo Santana
27/10/06

Em Segredo

Depois de assistir café da manhã em plutão, tive a felicidade de poder assistir "em segredo", filme que me agradou um pouco mais. Os personagens são mostrados com suas limitações e não pude ver no filme nenhum "mocinho" a representar um pilar ético, ou a lição de moral dada pelo filme. Os personagens centrais, mãe e filha, tentam viver com seus problemas, sendo que a mãe ia sempre tentando expurgar e esquecer tais problemas sem enfrentá-los, e talvez por isso, acaba muitas vezes se retraindo e outras tantas descontando na filha as suas frustrações. Ao final a mãe acaba tendo que enfrentar seus maiores dilemas e o filme não deixa claro como ficará a relação mãe e filha depois disso. Com isso o filme não trouxe grandes fórmulas morais, uma vez que deixa em aberto qual o resultado final da relação entre mãe e filha, a partir do comportamento adotado pela mãe (que é tomado aqui com maior relevância na análise, uma vez que ela preexistia à filha, sendo a última muito mais influenciável pela primeira do que o contrário, em nossa opinião). Nada contra filmes panfletários, desde que não sejam "excessivamente deterministas" (o excesso estará obviamente na capacidade de cada observador em suportar tal panfletagem até o ponto de sentir-se manipulado, desrespeitado, se isso o incomodar. A coluna do Diogo Mainardi na Veja, a título de exemplo, faz-me sentir-me incomodado, desrespeitado em meu senso crítico, aqueles que tenham um pensamento ideológico mais afinado com o do Sr. Diogo provavelmente não sentirão a mesma coisa. Com isso, afirmo ainda que minha capacidade de aceitação de uma obra panfletária vai depender não apenas do grau de "manipulação" ou "determinismo" que ela queira impingir ao pensamento do observador, como também com minha afinidade coma obra). Um lindo filme panfletário em minha opinião é Gandhi, que porém eu assisti a muito tempo e por isso dele pouco recordo-me fora a idéia que passa. Todavia panfletar acerca de idéias "universalmente" aceitas como liberdade, igualdade, etc (para não correr o risco de escrever ali fraternidade, hehe..) é muito mais fácil do que panfletar acerca de condutas morais. Nesse quadro (moralidade das condutas) prefiro filmes como Dogville no qual, apesar de toda a condução do Diretor, ele parece nos deixar com uma grande margem de interpretação, e a possibilidade de valorações bem discrepantes, não parecendo querer nos enfiar uma única "valoração verdadeira".
Enfim, "Em Segredo" embora não tenha sido o melhor filme da semana, é um filme que acredito vale a pena assistir. Destaco agora uma cena que achei bem legal que é a da filha com um colega da escola, numa quadra de patinação no gelo, onde o colega finge estar passando mal para no fim tirar seu "coração" (um chaveiro em forma de coração) e ficar balaçando na frente dela que tenta pegar, aparentemente sem sucesso até rolarem no chão (ou melhor no gelo), "brigando" pelo chaveiro coração.
Nilo Santana, 27/10/06
Café da Manhã em Plutão
Meu primeiro pensamento "crítico" sobre o filme foi; "muito grande, muito complexo", o que em minha opinião atesta muito pouco sobre o filme e muito mais sobre a minha profunda imersão no cotidiano, na banalidade,ou melhor,a minha falta de sensibilidade no momento. O filme conta a história, ou melhor, a jornada, de Patrick, ou Patrícia, em busca de algo. Sentir-se incompreendida,e de certa forma, por isso, excluída, é o que inicialmente a motiva em sua busca. O algo que Patrick buscava ganha forma quando ele descobre que é filho de uma mulher que deixou a cidade a muito tempo e que fora empregada do padre da cidade. Neste momento a personagem elege a busca da mãe,ou melhor um futuro encontro com ela, como uma possível solução de seus problemas. Mas isso não está claro no filme,é apenas uma leitura que eu ofereço a quem leia as presentes linhas, afinal a obra de arte estará sempre inconclusa a espera do público que lhe enxerte de significações e ressignificações.
A partir daí se inicia a jornada em busca da Dama Fantasma (a mãe de Patrícia). A opressão inglesa sobre os irlandeses pode ser levemente sentida no filme, que não chega porém a fazer uma apologia revolucionária. Se há alguma apologia no filme talvez esteja ligada à questão da alteridade, tão na moda recentemente. Tratar de minorias (no caso a personagem que se "traveste") quase sempre leva a esse ponto. Patrick talvez não seja um personagem que "faça sua história", mas é ao menos um personagem que tem a coragem de se "jogar" e deixar que a vida o leve, e ela o leva a momentos de dissabores e felicidades.
De fato o diretor conduz claramente (minha leitura) a uma simpatia por Patrícia, ainda que em alguns momentos sua "porra louquice" possa gerar no espectador um pequeno distanciamento. Não chega porém a despertar sentimentos muito conflitantes. O pai de Patrícia é um personagem desfavorecido na trama já que aparece em aspectos opostos no inicio e na segunda parte do filme, sem que possamos acompanhar melhor a sua mudança. Mas afinal o diretor faz suas escolhas. Como coadjuvante porém tem um papel importante e aparece em uma grande "virada do filme". O momento em que Patrícia Gata finalmente se aproxima do encontro com a Dama fantasma. No final ela desiste de se apresentar à sua mãe e diz ao pai que sua busca por ela levou-a a ele. Inovou-se ao não se dizer que a jornada pela mãe levou-a a si mesmo, o que porém permanece como uma leitura plausível.
Mais um momento de "choque de alteridade" e a residência do padre (pai de patricia), onde Patrícia e uma amiga de infância dormiam é incendiada. Nesse momento separam-se novamente pai e filho com promessas de visitas futuras.
O filme termina com um novo encontro, "ao acaso", entre mãe e filha, ou melhor, entre filho e irmão em que Patrícia não mostra-se disposta a promover uma "revolução", pra ela não mais importa se apresentar à mãe, é como se saber ser isso possível já bastasse, afinal a mágica era mesmo encontrar a mãe, não conhecê-la efetivamente.
Não mais recordava a parte do filme que me trouxe algumas lágrimas. Creio que tenha sido a desistência da amiga de Patrick em abortar. O chato é que o diretor parece querer contrastar a revolução à felicidade, ou ao menos isso me parece uma leitura plausível. A amiga de Patrícia anti-revolucionária se decide pela vida, já o violento "revolucionário" do seu marido acaba morto em uma demonstração da frieza da causa. Nesse ponto prefiro adeus Lênin que parece pregar que a causa não precisa ser necessariamente fria nem tão distanciada do sujeito. Plutão parece levar a idéia de que as ideologias morreram e que a revolução é uma farsa porém não chega a ser uma defesa do individualismo. Porém defender simplesmente a solidariedade e a melhor aceitação da alteridade é uma defesa realmente transformadora? Não sou um apologeta da revolução, sou "Bobbiano" nesse aspecto e acredito num gradual aprofundamento da democracia como melhor meio à qualquer transformação social. Melhor não significa único. Porém a defesa da morte das ideologias e equiparar toda a luta a uma luta cega não seria também esquecer o sujeito de uma outra maneira apenas? As ideologias não devem ser descartadas como se não representassem, em alguns casos, a ânsia de sujeitos em busca de uma libertação. Adeus Lênin me passa uma idéia de uma postura crítica frente a elas e nesse aspecto a prefiro do que o filme em comento. Porém esse não me parece o tema central do filme como foi o caso de Adeus Lênin e por isso me parecem injustas as comparações aqui traçadas.
Resumindo, gostei do filme, me fez chorar em pelo menos um momento, me fez rir em vários, me indignou, me fez lembrar dois de meus filmes preferidos –o fabuloso destino de amelie poulain e moulin rouge, e me fez ter de gastar dez reais de táxi (parte chata da história).Valeu a pena ter filado a aula de Direito Penal.

Nilo Santana
Salvador, 23 de outubro de 2006,